Duas perguntas para Lázaro Roberto

Categorias entrevista

Lázaro Roberto, também conhecido como Lente Negra, é um fotógrafo de rua e arte educador baiano, militante do movimento negro. Sua inserção no universo da fotografia aconteceu em meados dos anos 1970 quando começou a registrar pessoas na periferia da cidade de Salvador, em situações que representavam as raízes e a cultura afrodescendente em sua atuação cotidiana. Na década de 1990, ao lado de Raimundo Monteiro e Aldemar Marquês, com o objetivo de fortalecer os fotógrafos e as fotografias de negros, fundou o Zumvi Arquivo Fotográfico, uma associação de fotógrafos engajados em registrar atividades culturais, políticas e artísticas que produz e arquiva imagens sobre a cultura afro-brasileira.

Lázaro Roberto é um dos convidados do 12º FestFoto e participará da mesa Identidade, Cotidiano, Resistência junto a Igor Simões, no dia 28 de abril, às 16h30. Parte de suas fotografias de penteados afros integrarão a mostra coletiva que estará em exposição na Fundação Iberê Camargo a partir do dia 27 de abril. Mais sobre o trabalho do fotógrafo pode ser visto em seu instagram pessoal.

1. A sua relação com a fotografia se dá em conjunto com a sua relação com o movimento negro. Para ti, de que maneira essas duas atividades se relacionam?

A minha relação com a fotografia se deu junto com a minha inserção no movimento negro naquele período, na década de 1970. Eu sou oriundo de grupos de teatro da periferia, que eram muito comuns naquele contexto da ditadura militar. Foi através destes grupos que eu descobri a fotografia. Na minha vida, essas duas atividades são importantes. Eu sempre digo que o movimento negro me deu a consciência, a formação intelectual acerca do racismo. Nele eu aprendi muitos discursos teóricos, era nele que a gente discutia sobre questões estéticas, sobre violência policial e sobre todas as mazelas do racismo que o agente negro sofre. Através da fotografia se revelava a constatação. A partir do momento que eu adquiri uma máquina fotográfica, fui para rua e era como se eu tivesse documentando o que eu aprendia dentro do movimento negro. Eu resumiria que o movimento negro foi minha escola teórica e a fotografia de rua foi a escola prática que me deu a visão de mundo do local que eu vivo e sobre a minha realidade.

2. Como você acha que a fotografia pode ajudar na construção da identidade afro-brasileira?

Acho que a fotografia pode e deve ajudar muito para uma identidade brasileira. As imagens históricas que nós temos sobre pessoas negras são imagens de escravizados. A fotografia foi inventada durante o século XIX, mas é só em meados do século XX que a fotografia chega as mãos de famílias negras. Depois vem a democratização da fotografia. As fotografias tem que estar nas salas de aulas, nas aulas de história. O professor tem que usar as imagens para resgatar nossa história, que nos foi negada e deturpada, como a história do quilombo de palmares, de Zumbi, de Akotirene, Luiz Gama e muitos ouros heróis e heroínas negras. As imagens devem fortalecer a Lei 10.639/ 03, lei que torna obrigatória a presença da cultura afro-brasileira nas escolas. No campo da publicidade, os negros têm que aparecer de uma maneira que valorize a sua estética, assim podemos buscar uma identidade brasileira. É difícil encontrar fotógrafos negros com meu perfil, mas podemos estimular a formação de profissionais com o objetivo de construir imagens “positivas”, assim como também estimular a discussão das imagens negativas. Mais uma vez, eu afirmo que devemos levar imagens negras para dentro das escolas, para que as crianças vejam imagens de si.

É pesquisadora, mestre em Historia Teoria e Crítica de Arte e bacharel em Ciências Sociais, ambos pela UFRGS.

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